13 novembro, 2006

Eng. Marcelino Ramos da Silva: notas biográficas

O construtor da Estrada de Ferro do Norte

O Engenheiro Marcelino Ramos nasceu no Rio de Janeiro, a 2 de agosto de 1844. Era filho do comendador Tristão Ramos da Silva e de Joaquina Luiza de Oliveira.

Dedicou grande parte de sua carreira à construção ferroviária, tendo sido durante muitos anos funcionário da Estrada de Ferro D. Pedro II (Central do Brasil). Por volta de 1870 ocupava um posto de Condutor de 1ª Classe. Nos dois últimos anos (1880/1881) em que trabalhou nessa estrada Marcelino Ramos era chefe de seção em Entre-Rios, na divisão responsável pela via permanente, chefiada pelo engenheiro João Teixeira Soares.

No ano de 1874 foi requisitado para compor uma comissão incumbida de estudar e propor um plano geral de melhoramentos para a cidade do Rio de Janeiro, sob os aspectos de urbanismo e saneamento. Faziam parte dessa comissão o engenheiro-militar Jerônimo Rodrigues de Morais Jardim, então chefe da Inspetoria de Obras Públicas (repartição que mais tarde se transformaria no Ministério da Viação e Obras Pública, dos primeiros tempos da República), e o também engenheiro Francisco Pereira Passos, que duas décadas mais tarde, no cargo de prefeito, implementou grandes reformas que a cidade necessitava.

A partir de 1882 Marcelino dedica-se à construção de ferrovias privadas. Entre 1882 e 1883 esteve envolvido, juntamente com o engenheiro Joaquim Lisboa, na construção da Estrada de Ferro Príncipe do Grão-Pará, na serra de Petrópolis, que dava continuidade ao projeto do Barão de Mauá iniciado em 1852-1854. Essa estrada era a primeira a utilizar no país o sistema de cremalheira “Riggenbach” para vencer a forte inclinação da via, sistema depois utilizado na E. F. do Corcovado, por Pereira Passos e Teixeira Soares.

Nos anos seguintes está engajado nas obras da Estrada de Ferro do Norte, projetada por Jerônimo Jardim, que ia de São Francisco Xavier até o entroncamento com a citada estrada de Mauá. Essa ferrovia, cruzando a baixada da Guanabara em territórios que hoje pertencem ao município de Duque de Caxias, teve o seu trecho final inaugurado em abril de 1888.

Quando foi proclamada a República, Marcelino foi um dos signatários de uma manifestação de apoio ao governo provisório promovida pelo Clube de Engenharia, em sessão realizada no dia 19 de novembro de 1889.

Em 1894 é organizada pelo governo a Comissão de Estudos e Saneamento da Baixada Fluminense, com a intenção de buscar soluções para o grave problema das áreas inundadas que eram um grande foco para a malária. Marcelino assumiu a chefia dessa comissão quando João Teixeira Soares deixou o posto.

Anos mais tarde assumiu o encargo de executar as obras de um trecho da ferrovia São Paulo – Rio Grande do Sul. Era um projeto de seu amigo Teixeira Soares, cujo objetivo era ligar a cidade do Rio de Janeiro, já conectada com São Paulo por via férrea, às regiões de fronteira no sul do país, cruzando o interior do Paraná e de Santa Catarina. O trecho que coube a Marcelino, de 179,9 quilômetros, ligava a cidade de Passo Fundo ao rio Uruguai, na fronteira com o estado de Santa Catarina.

As obras foram concluídas em outubro desse mesmo ano, e em dezembro ficou pronta a ponte provisória que ligava essa estrada ao trecho também concluído no estado de Santa Catarina. Seria seu último trabalho. Nesse mesmo mês de dezembro, no dia 26, Marcelino Ramos faleceu, no Rio de Janeiro.

Em sua homenagem a estação próxima ao rio Uruguai, no trecho que ele havia construído foi batizada com o seu nome. Hoje é um importante município daquele estado.



Bibliografia:
Almanak Laemmert, Rio de Janeiro, várias edições,
Barata, Carlos Eduardo e Bueno, Antônio da Cunha Dicionário das Famílias Brasileiras. Ed. Árvore da Terra. 2001. 2 v. (verbetes “Oliveira” e “Torres Oliveira”)
Brasil, Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Relatório Anual, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, várias edições
Figueira, Manuel Fernandes. Memória histórica da estrada de ferro central do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1908. 960 p
Rodrigues, Helio Suêvo. A formação das Estradas de Ferro no Rio de Janeiro: o resgate de sua memória. Rio de Janeiro, Memória do Trem, 2004. 192 p.
Telles, Pedro Carlos da Silva. História da Engenharia no Brasil: séculos XVI a XIX. R.Janeiro, Liv.Tecnicos e Científicos. 1984, 510 p.

08 novembro, 2006

Barão do Rosário: notas biográficas

O primeiro gestor da Leopoldina Railway (1898)

João José do Rosário fez uma longa e profícua carreira no Ministério da Fazenda, na segunda metade do século 19. Foi um especialista na área de orçamento e controle da dívida pública.

Consta que em 1866 já ocupava um posto de Segundo Escriturário na Diretoria Geral de Contabilidade. Dois anos depois foi comissionado para uma missão especial, em Londres, como Delegado do Tesouro, nomeado por decreto imperial. Ficou lá até 1873. De volta ao Brasil foi promovido, em 1875, a Primeiro Escriturário. No ano de 1879 assumiu o cargo de Contador na 1ª Contadoria da Diretoria Geral de Tomada de Contas, sempre no mesmo ministério.

Nesse mesmo ano foi um dos 14 especialistas consultados pelo titular da pasta, o Visconde de Ouro Preto, sobre alternativas para a criação de novos impostos que pudessem equilibrar as finanças do governo. Seu parecer foi um dos mais bem elaborados, com sugestões oportunas e judiciosas que seriam citadas, duas décadas mais tarde, por Rui Barbosa, ministro da Fazenda dos primeiros tempos da República, então exigido a se preocupar com aquele tema. As referências de Rui fizeram aumentar a notoriedade de Rosário e valeu para incluí-lo como um dos precursores da introdução desse imposto no Brasil.

Em 1880 retornou à sua Diretoria de origem assumindo o cargo de Contador da 2ª Contadoria onde ficou até ser convocado, em 1884, para ocupar o importante cargo de Inspetor Geral, principal executivo da Caixa de Amortização, instituição que era responsável pela gestão da dívida pública, governada por uma Junta presidida pelo Ministro da Fazenda. Em 1885 assumiu o posto de Diretor Geral de Contabilidade do Tesouro onde ficou, pelo menos, até 1889. Nesse ano era, também, um dos membros do Tribunal do Tesouro Nacional, outro colegiado presidido pelo ministro da Fazenda.

Foi agraciado pelo Imperador Pedro II, com o título de Barão do Rosário a 5 de maio de 1889.
Em 1896 a Estrada de Ferro Leopoldina estava afundada em dívidas quando sobreveio o escândalo da Cia. Geral de Estradas de Ferro do Brasil, uma espécie de “holding” que controlava a Leopoldina. Naquela altura essa ferrovia era ainda presidida pelo Conselheiro Paulino, um histórico político do império aposentado de seu cargo de presidente do Senado pelo movimento chefiado por Deodoro. Paulino ainda tentou negociar a salvação da empresa, mas não teve êxito e a Leopoldina acabou tendo a sua liquidação forçada pelos credores, na sua maioria ingleses. É nesse momento que entra em cena o Barão do Rosário, experimentado negociador de grandes dívidas, fluente em inglês e grande conhecedor dos financistas daquele país.

O Barão está presente, em 16 de novembro de 1897, à assembléia dos credores da Leopoldina que definiu as condições de liquidação daquela empresa. Decidida a transferência das ferrovias que era concessionária para a recém constituída Leopoldina Railway, os ingleses detentores do seu controle, encontraram no Barão do Rosário a pessoa que talvez tivesse, naquelas circunstâncias, os melhores predicados para gerenciá-la. Mas como preposto dos ingleses careciam-lhe as condições para repetir a habilidade negociadora que havia marcado a gestão do Conselheiro Paulino durante o período mais difícil da empresa antecessora.

Um de primeiros desafios de sua gestão lhe foi apresentado pelo advogado José Antonio Pedreira de Magalhães Castro, representante de fazendeiros e comerciantes do rio Iguaçu. Eles tinham uma dívida a cobrar da Leopoldina por terem ganho uma demanda judicial contra uma das ferrovias que agora fazia parte do patrimônio da Leopoldina Railway. O caso dizia respeito à Estrada de Ferro do Norte, que fazia a ligação entre São Francisco Xavier, no Rio de Janeiro, e o entroncamento com a antiga estrada de Mauá a Raiz da Serra, no município de Magé. Essa estrada havia construído uma ponte sobre o canal do rio Iguaçu que impediu a navegação dos saveiros dos tradicionais usuários do rio. Os iguaçuanos moveram então, ainda no ano de 1886, uma ação demolitória que só veio a receber a sentença definitiva em 1889, já quando a ferrovia estava sob controle da antiga Leopoldina. Por contas das dificuldades financeiras da empresa e das habilidades negociadoras do Conselheiro Paulino, a execução da sentença foi sendo protelada na expectativa de uma indenização em dinheiro em troca da citada demolição. A posição de Rosário em relação à pendência parece não ter dado esperanças aos iguaçuanos sobre a tão esperada indenização. Assim, e após algumas trocas de acusações mútuas pela imprensa, entre o advogado dos iguaçuanos e o Barão do Rosário, a ponte acabou por ser demolida em outubro de 1898, com prejuízo para o fluxo de trens naquela importante linha. O tráfego normal só seria reaberto em janeiro de 1901, através de uma nova ponte, levadiça, para dar passagem aos barcos.

Anos mais tarde, depois de se desligar da Leopoldina, o Barão do Rosário voltou a viver em Londres, quando passou a integrar um ilustrado grupo de correspondentes estrangeiros que colaboravam com o Jornal do Brasil.





Bibliografia:
Almanak Laemmert, R.Janeiro, Tip.Laemmert, várias edições
Brasil, Ministério da Fazenda, Relatórios. R.Janeiro, Imp. Nacional, várias edições.
Brasil, Ministério da Fazenda, informações acessadas em 30/09/2006 no site http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/SRF/Historia
Gontijo, Silvana. A Imprensa no século XX, in O Mundo em Comunicação. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2001, consultado em 16/10/2006 no site http://www.manonitas.com.br/transf/martins/uniban/luci/2006.03.06.
a_imprensa_no seculo_xx.doc.
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Magalhães Junior, R. Deodoro: a espada contra o Império. S.Paulo. Ed.Nacional. 1957. 2 vol.

As ferrovias do Rio de Janeiro na Revolta da Armada de 1893 - Anexo

O depoimento do capitão-tenente Conceição



 Foto de Juan Gutierrez; acervo do Museu Histórico Nacional Fortificação passageira com soldados e oficiais da artilharia, 1894.

Com seus trilhos correndo paralelamente às margens da baía da Guanabara, então ocupada pela esquadra revoltada do Almirante Custódio de Mello, a Estrada de Ferro do Norte tornou-se, desde o início das hostilidades, uma peça estratégica importante para o esquema de defesa do Marechal Floriano Peixoto e do seu governo. A interdição dos serviços de barcas entre a capital e o porto de Mauá, em Magé, tornara aquela ferrovia o único acesso à Fábrica de Pólvora, em Estrela, ao norte da baía. Era também o melhor caminho para se chegar a Petrópolis, que havia sido promovida a capital do Estado do Rio de Janeiro, face à grande exposição de Niterói às forças comandadas por Custódio. Por tudo isso aquela ferrovia viria a ser intensamente utilizada pelas tropas do governo, nos meses seguintes, como meio de transporte para soldados e equipamentos bélicos. Mas era igualmente importante protegê-la, pois as pontes sobre o Meriti, o Iguaçu e vários outros rios da região por onde corriam os seus trilhos, eram peças vulneráveis e possíveis alvos de ataques ou sabotagem. Além do mais aqueles rios eram razoavelmente navegáveis e por eles seria possível que os revoltosos fizessem incursões em terra para se abastecer ou para estabelecer bases de ocupação. As pontes, portanto, mereciam enorme atenção das tropas, tanto como objeto de proteção mas, também, como um posto de defesa para conter eventuais tentativas de infiltração através dos rios.

Por outro lado, o fato de se defrontarem os cariocas e fluminenses com uma frente de batalha tão próxima às áreas urbanas, fez com que a possibilidade de contato entre os soldados e seus aflitos e preocupados familiares ficasse muito facilitada. Passado o primeiro grande susto, que levou milhares de pessoas a lotar as estações ferroviárias e a buscar outros meios de transporte que pudessem retirar suas famílias da linha de tiro dos canhões do Aquidabã e das outras belonaves sob o controle do almirante, as escaramuças e as manobras militares forma se incorporando no ritmo de vida da população.

A história de um desses muitos contatos ficou registrada por “O País”, um dos principais jornais da época, publicada na edição do dia 10 de outubro de 1893. Era a reprodução de uma carta endereçada por um leitor, o capitão-tenente Conceição, descrevendo o encontro com o filho, alistado em um batalhão de voluntários e enviado para defender a ponte da ferrovia sobre o rio Iguaçu, na chamada “Passagem de São Bento”. A revolta havia sido deflagrada a pouco mais de um mês, no dia 6 de setembro, e as pessoas ainda não tinham uma idéia clara do que poderia resultar daquela confusão. Portanto, as primeiras sensações que a contenda inspirava estavam bastante vivas e transparecem claramente do depoimento do capitão-tenente, em meio, como seria natural, às preocupações mais pessoais sobre o bem-estar do ente querido.
Por seu valor testemunhal sobre o que se passava ao longo daquela ferrovia, reproduz-se, a seguir os principais trechos da longa narrativa publicada pelo jornal.

“Ansioso por saber notícias positivas acerca da localidade e bem estar do meu filho Alfredo Conceição, há dias internado com o batalhão patriótico 23 de Novembro, dirigi-me ontem, 8, de manhã à estação de S. Francisco Xavier, da estrada de ferro do Norte, onde acompanhado de meu filho Mário, aluno do colégio militar, e de um fâmulo, tomei o trem para a Penha, supondo dali dirigir-me à Fazenda Grande, onde contava encontrar o ente querido, a quem eu ia levar o conforto paternal[1]. Ao embarcar no trem, soube por oficiais que acabavam de chegar, que o batalhão 23 de Novembro se achava guardando as pontes sobre os rios Meriti e Iguaçu, da via férrea do Norte, achando-se meu filho nesta última. Estando a largar o trem, segui para a Penha, afim de lá tomar nova resolução.
Às 10 horas ali chegando, soube que só às 5 horas [da tarde] haveria outro trem para cima e que, se eu nele fosse, não voltaria no mesmo dia
[2]. Passei um telegrama a meu filho e preveni-o de que nesse trem [o das 5 da tarde] iria a muda de roupa[3].
O coração me ficava despedaçado, uma espécie de remorso me corroia a alma e me dizia que eu devia ver meu filho, custasse o que custasse. O chefe da estação da Penha me informara que dali ao Iguaçu havia a distancia de 20 quilômetros, distância que em três horas poderia ser vencida a pé
[4]. Mas a lama escorregadia que havia sobre o leito da estrada era um obstáculo digno de ser ponderado. Entre o desejo e a ventura, o meu filho Mário entusiasmou-me. Eram 10 horas e 20 minutos quando empreendemos a marcha. Vencido o primeiro quilômetro, vi, pelo relógio, que o havíamos feito em 13 minutos; dando para os outros [quilômetros] 15 minutos, formei a intenção de às 2.1/2 da tarde abraçar meu filho, e assim foi.
Ao meio-dia avistávamos a ponte sobre o rio Meriti e, quando nos achávamos a 500 metros, eis que surgem de trás das colunas alguns vultos humanos encapotados, os quais, empunhando armas, puseram-se em atitude de obstar-nos a marcha, intimando-nos a grandes brados:
“- Faça alto!”
Obedecemos, e depois que por meio de gritos expliquei-me, recebi a ordem de
“- Pode chegar.”
Aquilatei por isso que os rapazes, apesar da noite cruel por que passaram anteriormente, estavam alerta, firmes e resolutos.
Chegado à ponte, verifiquei isso mesmo e mais, que até àquela hora não tinham almoçado os que a guardavam. Eu mesmo tive de levar o recado ao quartel do posto, dali a 2 quilômetros, onde à meia-hora depois do meio-dia cheguei, tendo a satisfação de ter encontrado em caminho o troço [grupo] que ia render os outro
[5]s.
Depois de pequeno descanso, empreendi de novo minha marcha. Estávamos no quilômetro 20 e a chuva começou a cair, fina, sem aragem alguma, pelo que o suor nos corria em grossos bagos
[6]. Os pés se nos pesavam, graças ao acumulo da lama pegajosa nos sapatos. Raros transeuntes encontrávamos. Às 2 horas verificamos estar no quilômetro 25 e ouvimos dois tiros. Estávamos em uma curva quando, ao sairmos dela, avistamos a ponte grande do Iguaçu, sobre a qual se movia um troço de homens que pareciam satisfeitos, pelos modos por que se moviam apesar da chuva. Apertamos o passo e depois da mesma formalidade anterior aproximamo-nos da ponte, sobre a qual, empunhando a sua arma, avistei entre os outros o meu filho, que veio logo abraçar-me e ao seu irmão.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Tive ocasião de verificar o bom espírito dos voluntários, a decidida vigilância que eles exercem e o desejo ardente que nutrem de se medirem com os inimigos da República.
Já tinham almoçado, sendo-lhe a comida feita por contrato, da estação do Pilar, dali a 3 quilômetros, em troly.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Confortei meu filho, aconselhei-o a uma boa disciplina, não obstante o digno comandante major Dr. Moraes e capitão Elídio afirmarem-me o seu excelente modo de proceder; fiz-lhe ver que o voluntário, mais que outro qualquer, tem o dever de ser o tipo do soldado, e às 5 horas fui tomar o trem no Pilar, chegando a S. Francisco Xavier às 8.1/2 da noite e à casa, estropiado, às 9.1/2.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .”.
Notas:
[1] A Fazenda Grande era uma gleba de terra onde se desenvolveu o bairro da Penha.
[2] Em 1889 o trem fazia apenas duas viagens diárias. Levava cerca de 20 minutos para ir de S. Francisco Xavier à Penha.
[3] Uma das condições para a concessão de ferrovias na época é que as empresas concessionárias construíssem linhas telegráficas interligando as estações.
[4] Na verdade a distância entre a estação da Penha e a ponte sobre o rio Iguaçu, seguindo a linha do trem, era de 17 km.
[5] Ficaria próximo à atual estação Duque de Caxias, que dista 1.700 metros da ponte do Meriti.
[6] Neste ponto (km. 20 da ferrovia) fica a ponte sobre o rio Sarapuí. Como o relato não menciona a existência de vigilância armada nesse local é provável que esse rio já não tivesse naquela época condições de ser navegado. Além da ponte do Sarapuí o capitão-tenente deverá ter passado também nos pontos onde existiam as paradas de Meriti, Sarapuí, Pantanal e São Bento. Nesses pontos não deveria haver qualquer instalação digna de referência e que pudesse servir de apoio aos utilizadores da ferrovia.

02 novembro, 2006

Luis Plínio de Oliveira: notas biográficas

O Primeiro Presidente da E. F. do Norte


O Comendador Luiz Plínio de Oliveira (06.07.1834 – 22.05.1909) foi o primeiro presidente da empresa constituída em novembro de 1883 para construir e explorar uma ferrovia ligando a cidade do Rio de Janeiro à raiz da serra de Petrópolis: a Estrada de Ferro do Norte. A concessão havia sido aprovada no ano anterior em favor do cidadão Abílio Luiz Pereira da Silva.

O presidente da E. F. do Norte nasceu no Rio de Janeiro, filho do Conselheiro Candido Batista de Oliveira, gaúcho de Porto Alegre (1801-1865) e de Ana Chagas. O pai, formado na Universidade de Coimbra em matemática e filosofia, havia sido uma importante figura do Império, tendo ocupado inúmeros postos no governo. Foi embaixador, ministro, deputado, senador e professor. Uma das atividades em que mais se destacou, desde 1826, foi voltada para a adoção do sistema métrico, proposta que finalmente tornou-se lei em 1862. Entretanto, Candido não chegou a ver a sua implantação efetivada, tendo falecido no ano de 1865, quando era senador. O sistema métrico seria colocado em operação apenas em 1872.

A carreira pública de Plínio de Oliveira não seria tão brilhante quanto a do pai. Em 1860 era um 2º Oficial no Ministério dos Estrangeiros (Relações Exteriores) onde ficou até 1865. Nesse ano foi convidado para assumir a Diretoria dos Correios, órgão subordinado ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Sua nomeação teria sido justificada por um estudo que havia publicado em 1862 sobre a organização dos serviços dos correios da Inglaterra e da França. O relatório de 1866 do ministro Antonio Francisco de Paula Souza (1819-1866), não lhe poupava elogios:

“Convencido de que o serviço do correio é um dos ramos da administração pública que mais desvelos deve merecer os poderes do estado, tratei de dar execução ao decreto nº 3443 de 12 de abril de 1865, que aprovou o novo regulamento postal do império. Convencido, ainda, de que a perfeição deste serviço muito depende do conhecimento prático do jogo material das diferentes partes do mecanismo, de que se compõem esta repartição, e havendo ficada extinta a 4ª diretoria desta Secretaria de Estado, coloquei à testa da administração do correio o Sr. Luiz Plínio de Oliveira, o qual às habilitações especiais adquiridas em diversos países da Europa reunia um zelo, dedicação ao trabalho e traquejo dos negócios tão notáveis como sua modéstia e probidade”.

Plínio de Oliveira parece ter-se dedicado com afinco às suas novas responsabilidades ficando no cargo durante quinze anos, até 1880. Durante a sua gestão deu-se a implementação de importantes inovações nos serviços postais brasileiros. Logo em 1866 foram lançados os primeiros selos picotados e os selos contendo a efígie do Imperador Pedro II. Em 1872 é a vez do lançamento dos primeiros cartões postais ilustrados. Os primeiros selos postais em duas cores foi uma inovação lançada no ano de 1878. Dois anos depois os bilhetes postais foram instituídos no Brasil.

Tais realizações renderam ao Diretor dos Correios algumas condecorações. Foi Moço Fidalgo com exercício na Casa Imperial, Comendador da Real e Distinta Ordem Espanhola de Carlos III, da Real Ordem Belga de Leopoldo, Prussiana da Coroa e da Coroa Italiana.

A gestão de Plínio de Oliveira à frente da Estrada de Ferro do Norte foi bem mais curta que nos Correios. Durou até o mês de abril de 1888, quando ficou concluído o trecho final da ferrovia, ligando a Vila do Pilar ao entroncamento com a ferrovia que havia sido inaugurada em 1854 pelo Barão de Mauá. [Esse entroncamento fica onde é hoje a estação de Piabetá.] Na data da inauguração já estavam finalizadas as negociações de venda da estrada para a firma inglesa “The Rio de Janeiro & Northern Railway”. Sua época foi, portanto, a da construção da estrada, ainda que nesse período a ferrovia já conseguisse obter receitas crescentes apenas com o transporte de passageiros dos subúrbios do Rio de Janeiro.

Durante sua administração a empresa enfrentou alguns processos judiciais decorrentes do andamento das obras. O mais importante deles foi o que envolveu a construção de um conjunto de pontes sobre o rio Iguaçu, no ano de 1886. A polêmica se deu porque os moradores da região viram-se impedidos de continuar utilizando o rio para a navegação dos saveiros, embarcações com mastros mais altos para transporte de carga até o porto do Rio de Janeiro. A disputa foi acirrada e apesar do grande poder que as ferrovias tinham naquele período a justiça deu ganho de causa aos antigos usuários do rio. Mas a questão só foi encerrada em 1898, quando aquela estrada já estava sob controle da “The Leopoldina Railway”. Sem acordo, executou-se a demolição da ponte construída sobre o canal do mencionado rio, tendo que ser feita uma nova, porém com uma viga levadiça para dar passagem aos saveiros.

Ao que parece, as atividades profissionais do Comendador e de outros membros da sua família tinham profundas ligações com o setor de transportes. Seu pai chegara a obter, em 1856, uma concessão para explorar uma linha de bondes no Jardim Botânico, mas o projeto acabou sendo transferido para o Barão de Mauá, em 1862. Um dos irmãos de Plínio de Oliveira, Januário Candido de Oliveira, era engenheiro e havia sido funcionário da Central do Brasil, em meados de 1860. Em 1872 Januário e um outro irmão, Eugênio Batista de Oliveira, obtêm a concessão para constituir um serviço de bondes e o plano inclinado de Santa Tereza, o único ainda em atividade naquela capital. As próprias atividades de Plínio de Oliveira nos Correios eram, em sua essência, o gerenciamento do transporte e distribuição de correspondência, embora utilizando em grande parte meios de terceiros. Plínio ainda conseguiria, no ano de 1886, através da E. F. do Norte, a concessão para a construção de um ramal ligando um ponto nas imediações da rua Mariz e Barros ao alto da Boa Vista, na Tijuca, num trecho de 7.900 metros. Essa concessão seria transferida em 1890 para a E. F. da Tijuca.

Luiz Plínio foi casado com Maria Carolina Torres (1847-1885), filha do Barão de Itambi, Candido Rodrigues Torres (1806-1877). Faleceu no Rio de Janeiro, a 22 de maio de 1909, aos 74 anos.

(texto revisado em 19/11/2006)



Bibliografia:
Almanak Laemmert, R.Janeiro, Tip.Laemmert, várias edições
Barata, Carlos Eduardo e Bueno, Antônio da Cunha Dicionário das Famílias Brasileiras. Ed. Árvore da Terra. 2001. 2 v. (verbetes “Oliveira” e “Torres Oliveira”)
Blake, Augusto Victorino Alves Sacramento. Dicionario Bibliografico Brasileiro.Rio de Janeiro. Tip. Nacional, 1883-1902. 7 v
Brasil, Min.Agricultura, Comércio e Obras Públicas, R. Janeiro, várias edições
Brasil, Senado Federal.
http://www.senado.gov.br/sf/senadores%20acessado%20em%20out.2006
Dias, José Luciano de Mattos. Medida, normalização e qualidade; aspectos da história da metrologia no Brasil. Rio de Janeiro: Ilustrações, 1998. 292 p. Disponível em
http://www.inmetro.gov.br/noticias/livrometrologia.asp acessado em out/2006.
Jornal do Comércio, R.Janeiro, edição do dia 23/05/1909, p.13
Santos, Francisco A. de Noronha. Meios de Transporte no Rio de Janeiro, R.Janeiro. Tip.Jornal do Comercio. 1934. 2 vol.